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Da proteção do Espírito dos santos patronos

Artigo publicado na Revista Espírita de Setembro de 1868

A pergunta seguinte nos foi proposta ultimamente por um dos nossos assinantes:

“De lado todo preconceito de seita e de ideia mística, a qualificação de santo denota uma certa superioridade espiritual, porque, para merecer esse título, é preciso ter-se distinguido por atos meritórios quaisquer. De acordo com isto, e sendo a coisa considerada do ponto de vista espírita, os santos, sob cuja invocação nos colocam ao nascermos, não se tomam nossos protetores naturais, e quando celebramos a festa patronímica de alguém, aquele cujo nome ele carrega não é atraído por simpatia, e a ela não se associa, ao menos por pensamento, senão por sua presença?”

Há nesta pergunta dois pontos a considerar, que devem ser examinados separadamente.

Melhor que ninguém, sabem os espíritas que o pensamento atrai o pensamento, e que a simpatia dos Espíritos, sejam ou não beatificados, é solicitada por nossos sentimentos a seu respeito. Ora, que é o que determina, em geral, a escolha dos nomes? É uma veneração particular pelo santo que o tinha; admiração por suas virtudes; confiança em seus méritos; o pensamento de dá-lo para modelo do recém-nascido? Perguntai à maioria dos que o escolhem se sabem quem foi ele, o que fez, quando viveu, por que se distinguiu, se conhecem uma só de suas ações. Se excetuarmos alguns santos cuja história é popular, quase todos são totalmente desconhecidos e, sem o calendário, o público nem mesmo saberia que eles existiram. Assim, nada pode induzir o seu pensamento de preferência para um do que para outro. Nós supomos que para certas pessoas o título de santo basta, e que podemos tomar um nome de confiança, desde que esteja na lista dos bem-aventurados organizada pela Igreja, sem que seja preciso saber mais: é uma questão de fé.

Mas então, para essas pessoas, quais são os motivos determinantes? Há dois que predominam quase sempre. O primeiro é, muitas vezes, o desejo de agradar a algum parente ou amigo, cujo amor-próprio querem adular, dando o seu nome ao recém-nascido, sobretudo se daquele esperam alguma coisa, porque se fosse um pobre diabo, sem crédito e sem consistência, não lhe prestariam essa honra. Nisto visam muito mais a proteção do homem que a do santo.

O segundo motivo é ainda mais mundano. O que se busca quase sempre no nome é a forma graciosa, uma consonância agradável. Num certo mundo, sobretudo, querem nomes bem usados, que tenham um cunho de distinção. Há outros que são repelidos impiedosamente, porque não agradam nem ao ouvido nem à vaidade, por mais que pertencessem aos santos ou santas mais dignos de veneração. E depois, o nome é muitas vezes uma questão de moda, como a forma do penteado.

Há que convir que esses santos personagens em geral devem ser pouco tocados pelos motivos da preferência que lhes concedem. A bem da verdade, eles não têm nenhuma razão especial para interessar-se, mais do que por outros, por aqueles que têm o seu nome, perante os quais são como esses parentes afastados, dos quais só se lembram quando esperam uma herança.

Os espíritas, que compreendem o princípio das relações afetuosas entre o mundo corporal e o mundo espiritual, agiriam de modo diverso em tais circunstâncias. Ao nascer uma criança, os pais escolheriam, entre os Espíritos beatificados ou não, antigos ou modernos, amigos, parentes ou estranhos à família, um daqueles que, com seu conhecimento, deram provas irrecusáveis de sua superioridade, por sua vida exemplar, pelos atos meritórios que praticaram, pela prática das virtudes recomendadas pelo Cristo: a caridade, a humildade, a abnegação, o devotamento desinteressado à causa da Humanidade, numa palavra, por tudo quanto sabem ser uma causa de adiamento no mundo dos Espíritos. Invocá-lo-iam solenemente e com fervor, pedindo-lhe que se una ao anjo da guarda da criança para protegê-la na vida que vai percorrer, guiá-la com seus conselhos e suas boas inspirações; e em sinal de aliança dariam a essa criança o nome desse Espírito. O Espírito veria nessa escolha uma prova de simpatia e aceitaria com prazer uma missão que seria um testemunho de estima e de confiança.

Depois, à medida que a criança crescesse, ensinar-lhe-iam a história de seu protetor; contar-lhe-iam suas boas ações; ela saberia por que tem o seu nome, e esse nome incessantemente lhe lembraria um belo modelo a seguir. É então que na festa de aniversário o protetor invisível não deixaria de associar-se, porque teria seu lugar no coração dos assistentes.