Quem quiser estudar a obra de Allan Kardec precisa se preparar para o enxovalho! Por mais que seu nome seja usado como um distintivo social, que mais vale pela negação do que pela afirmação, como quem diz “kardecista” para não ser confundido com outro “ista”, já que na prática ele é apenas o codificador, de maneira que sua obra não fala muito com o dia a dia da brasilidade espírita. Se falasse, não causaria reações como essas da imagem acima; ela seria exceção, mas no fundo não é. Outro no meu lugar poderia fazer uso do coringa dos debates espíritas, que é o argumento da caridade, muito conveniente contra quem discordamos, basta carregar o ad hominem e dizer “você está faltando com a caridade”, portanto está errado. Nada disso, vamos ao que interessa.
No âmbito dos rótulos que desmerecem quem valoriza o Espiritismo, podemos listar: obsediado, louco, xiita, ortodoxo, arrogante, fanático etc, mas quadrúpede? Bem, essa é nova. É claro que o problema não é apenas a comparação ao animal, a questão é o seu acessório visual. Afinal, a alegação é que, tal qual o equino, estaríamos impedidos de olhar outras possibilidades, outras fontes de estudo espírita. Hum, será? A analogia é descabida pois não se trata de não vê-las, mas de por elas não se interessar; o critério é que faz a diferença, não o antolho. Não é que, os que estudamos Kardec, não vemos o que há além do seu trabalho; na verdade, por estudarmos sua obra, apreciamos melhor o que há por aí com o nome de Espiritismo. Kardec não é um obstáculo à visão de outros estudos, é uma lente que nos permite vê-los sob um prisma que lhes revela sua qualidade. Quem se familiariza com esse diapasão do ensino dos Espíritos, não precisa de muitas notas para perceber o quanto as produções do movimento espírita tropical são desafinadas. Apreciado o valor desses outros conteúdos, não só por uma questão de gosto, de estilo ou da falta dele, mas sobretudo de método, nada mais natural do que colocar essas obras no seu devido lugar. Que lugar seria esse?
Bem, para entendermos que lugar é esse ao qual nos referimos, temos de adentrar no domínio do autoconhecimento e das capacidades intelectuais dos indivíduos, mas primeiro vamos nos lembrar de algo que todo mundo sabe: o Espiritismo está sujeito a desenvolvimentos, esse conhecimento que deve avançar, vai progredir; do contrário, não passaria de uma religião com suas verdades prontas e acabadas. Quando vejo alguém dizer que o Espiritismo é muito mais do que o que Kardec nos apresentou, é claro que a pessoa se refere àquele aspecto do conhecimento espírita que lembramos acima, mas o que me impressiona é o fato desta obra tão profunda já ser dada como superada por tantas pessoas! Deixo aqui o registro da minha admiração pela capacidade intelecto-espiritual de quem parece já ter esgotado tudo o que foi produzido por Kardec. Certamente é esse o caso da pessoa que se incomoda com quem prioriza os estudos da obra fundamental, afinal, ela deve dizer para si mesma algo do tipo: disso aí eu já sei tudo, preciso aprender outras coisas.
É o tal autoconhecimento, cada um é que sabe do que é capaz, onde já chegou e o que ainda lhe falta. Enquanto uns se entendiam do tanto que sabem, ao ponto de buscarem outras fontes pois para eles Kardec já deu o que tinha de dar, outros têm consciência de que ainda falta muito o que aprender com ele. Por essa razão, ao invés de nos taxar como ortodoxos, deveriam nos chamar de neófitos. Como quem diz: eles só falam de Kardec porque não concluíram esses estudos ainda! E assim entramos na seara das prioridades. Ora, já que o tempo é algo que não temos de sobra, os que ainda não terminamos de estudar a obra fundamental, a colocamos em primeiro plano, as demais obras espíritas vão parar onde lhes é devido: o fim da fila. É claro que não é toda produção espírita que merece ir parar nessa posição, algumas só merecem como destino a lata do lixo, mas ninguém há de separar o joio do trigo espírita às cegas, esse ponto de vista que permite ver com clareza não é possível sem o uso da razão e da fundamentação em princípios.
Os que estudam a principal obra sobre Espiritismo e compreendem a própria ignorância sobre o assunto, dedicam-se a remediá-la e por isso somos considerados arrogantes, como se critério, bom senso e chá fizessem mal a alguém. Os que não nos entregamos à crença cega, ora veja! Somos chamados de fanáticos.
Para encerrar: você sabia que ninguém é obrigado a fazer Espiritismo como Kardec? Essa liberdade é a que também temos para tê-lo como referência e como tal nela nos basearmos para dizer se outros estudos relativos aos Espíritos coincidem ou não com os que Allan Kardec fez. Essa referência é o que buscamos construir à medida que avançamos no estudo das dezenas de livros escritos pelo mestre espírita. Só pedimos que seu trabalho não seja tratado aos coices.